Monique dos Anjos: “Se as cantoras podem usar perucas, por que nós não?”
A jornalista, dona do canal "Monique que disse", tem muita história para contar e vai dar um depoimento lindo e esclarecedor sobre cabelo crespo.
Sabe aquelas pessoas que nasceram para inspirar outras? A jornalista Monique dos Anjos, dona do canal de Youtube ‘Monique que disse’, é uma delas. Mãe de duas crianças, Victoria e Nicholas, ela consegue conciliar as tarefas de casa e ainda mantém seu canal atualizado com vídeos divertidos e que abordam assuntos relevantes para a sociedade moderna.
Jornalista de formação, já tentou mudar de profissão várias vezes. Sonhava em ser cantora, mas só depois de muitas aulas descobriu que não sabia cantar direito. Hoje ela é diretora em uma fundação informal de apoio a famílias carentes, é jornalista freelancer e grava vídeos para seu canal. Além disso, Monique tem um recado para dar sobre cabelo, que é lindo, esclarecedor e empoderado. Leia a entrevista!
ATH entrevista Monique dos Anjos
All Things Hair: Como foi sua relação com o cabelo durante a infância e a adolescência? E como é hoje em dia?
Monique dos Anjos: Quando eu era pequena, tive todo tipo de cabelo que você pode imaginar. Desde cabelo crespo natural, trancinha de kanekalon, até alisado com química ou com pente de ferro. Lembro que minha mãe levava minha irmã e eu para os lugares mais improvisados na cozinha das cabeleireiras e ficávamos dois, três dias sentadas até o cabelo ficar pronto. Também me lembro de sentir muita dor de cabeça por causa das tranças e dor no couro cabeludo por causa das químicas.
Mas ter um cabelo afro que não fosse “domado” naquela época era impensável. Não tinha nenhuma referência na TV e na família. Então eu só queria poder balançar meu cabelo por aí, coisa que nunca aconteceu.
ATH: Você revelou no seu canal que optou por usar perucas. Por que fez essa escolha?
Monique dos Anjos: Em 2011, eu e meu marido fomos ao Panamá só para conhecer a cidade antes de aceitar a proposta de emprego do meu esposo. Nesse período, decidi que iria usar trancinhas todos os dias (como era na infância), já que ninguém me conhecia naquele país. As trancinhas eram uma coisa que eu tinha abandonado na adolescência e substituído pela química com escova (o que me fazia ter medo da chuva e de transpirar).
Nessa viagem, não achei cabelo artificial para fazer trancinhas, mas achei uma loja de perucas. Quando eu coloquei uma peruca pela primeira vez, me senti como aquelas heroínas que quando mudam de roupa, adquirem superpoderes. Depois disso, comecei a pesquisar e comprar mais e mais. Mas ninguém nunca reparou porque minha vida toda sempre mudei de cabelo e as perucas eram afro também.
ATH: Quais dicas você dá para mulheres que querem usar extensões capilares?
Monique dos Anjos: Mais importante do que achar um fio que pareça natural é achar uma pessoa de confiança para aplicar. Alguém que não vai colocar cola no seu cabelo, que não vai fazer você andar de lenço por uma semana porque sumiu e alguém que não vai cobrar uma fortuna, porque é mesmo muito caro pela mão de obra e matéria-prima. Minha dica, quando possível, é pesquisar em sites estrangeiros e tentar encontrar uma para você. Às vezes, o imposto e a entrega saem mais caros que o produto, mas ainda assim vale a pena.
ATH: Quando você tira a peruca, quais os principais cuidados que tem com seu cabelo natural? Desde o banho até a finalização.
Monique dos Anjos: O cuidado com meu próprio cabelo quando tiro as perucas (para dormir, para tomar banho, quando estou em casa ou com dor de cabeça) é igual ao que tinha antes de usá-las. Tem gente que acha que não dá trabalho usar peruca, mas você tem que cuidar do seu cabelo real e do “fake”.
Lavo o meu natural a cada dois dias (mais ou menos), faço hidratação, corto, compro cápsulas de vitaminas e passo finalizador. Porque sei que amanhã posso enjoar das perucas e preciso cuidar com carinho do cabelo que continuará me acompanhando, seja curto, seja alisado. Quanto às perucas, uso shampoos específicos para cabelo sintético e corto um pouco do que embaraça, quase todo dia, para deixar com um ar menos bagunçado.
ATH: Você teve apoio de alguém ou buscou inspiração em alguém para usar perucas?
Monique dos Anjos: Não. Depois de achar uma loja por acidente, comecei a buscar na internet tudo a respeito e vi que havia milhares de garotas comprando e comentando. Só que ninguém fala disso, talvez por vergonha ou por tabu. Por isso que digo “se as cantoras internacionais podem usar perucas, por que nós não?”.
ATH: O que você acha desse movimento de muitas mulheres assumirem o cabelo natural?
Monique dos Anjos: Eu amo! Porque, como comentei, não tive referência nenhuma quando eu crescia, então eu era uma “alienígena” quando usava meu cabelo natural. Hoje em dia ainda tem muito preconceito, entre crianças e adultos, mas pelo menos muitos já enxergam como um ato de coragem, algo estiloso e que mostra uma personalidade forte e sem medo de ser diferente.
ATH: O que você diria para aquela mulher que quer alisar ou fazer qualquer coisa nos fios?
Monique dos Anjos: Diria que não adianta defender bandeira de se assumir quando não se levanta a bandeira de respeitar as próprias escolhas. Quem tem o cabelo liso não é menos corajosa (porque você imagina o trabalho que é fazer do seu cabelo algo que ele não é naturalmente?) do que quem usa cabelo crespo. Minha irmã sempre alisou e acha um absurdo eu gostar de cabelo bagunçado, e ela é uma das pessoas mais seguras que conheço. Ou seja, o cabelo dela nunca definiu quem ela era. O triste é quando se alisa o cabelo para não ser alvo de piada, de racismo, para não se sentir excluída ou ridicularizada.
Eu digo para essas meninas: se as pessoas com quem vocês convivem riem de você, elas não merecem sua atenção e sua presença. Meu marido é alemão e ama meu cabelo crespo. Prefere crespo e curto e não liso e longo. Assim como ele, tem muita gente que acha lindo, macio e divertido. Por que escutar só quem critica?
ATH: Quando surgiu a ideia de fazer o canal “Monique que disse”?
Monique dos Anjos: Sempre senti uma conexão especial com crianças e adolescentes (talvez porque na infância me sentia muito sozinha e hoje sempre estou cercada de crianças e filhos de amigas). Então adoro conversar com eles, saber seus dramas e sonhos. A ideia do canal no Youtube é pouco a pouco chegar a esse público e falar para elas tudo o que eu não escutei. Falar que quem as xinga pelo peso ou cor é que é errado e deveria sentir vergonha: queria poder dizer que esses dramas sempre estarão presentes, só não vão durar a vida toda.
Não adianta defender bandeira de se assumir quando não se levanta a bandeira de respeitar as próprias escolhas.
Ou seja, o amiguinho que te rejeitou hoje será o cara com o nome que você não vai lembrar amanhã. E falar que não somos todos iguais. Porque dizer isso, abrir a revista e só ver pessoas de uma cor de pele e cabelo acaba com qualquer um. Quero que saibam que somos todos diferentes e que isso é uma delícia. E que há beleza em tudo e em todos. Só não enxerga quem não quer.
ATH: Quais assuntos você aborda no canal?
Monique dos Anjos: Ainda não tenho um nicho. Já falei sobre viagens, sobre ser mulher negra e sobre filhos. Mas o mote principal é reforçar a autoestima (especialmente das meninas e mulheres, mas não só delas).
ATH: Nos conte algo para mostrar que referência é muito importante.
Monique dos Anjos: Aqui no Panamá, trabalho com crianças e adolescentes em situação de risco, com crianças de 4 a 18 anos que foram retiradas da família por negligência ou abuso. Eu sempre vou com meu cabelo mais armado, porque aqui não existe incentivo para valorizar a beleza natural. Todas as mulheres sempre usam cabelo preso, com muito gel e sem nenhum sinal de identidade pessoal, bem padrão.
Nas minhas palestras e dinâmicas, falo sobre como aceitar a si mesmo é mais importante do que buscar o amor de outra pessoa e que nosso cabelo não precisa ser igual ao de ninguém porque cada um tem uma singularidade que é bonita por si só. Enfim, tento explicar que o que pode ser estranho, como um cabelo afro volumoso, pode fazer sucesso nas passarelas de moda internacional.
Visitei esse grupo (50 crianças e adolescentes) por esses dias e, no dia seguinte, me mandaram foto de uma garota com o cabelo solto, para cima e igual ao meu. Fiquei tão feliz! Porque mais do que ouvir palestra motivacional elas precisam de referência. Eu entrei lá descabelada, bagunçada e poderosa. E foi isso o que ela quis reproduzir.
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