
Por um fio: por que a expressão ‘cabelo ruim’ ainda existe e é tão naturalizada em nossa sociedade?
Em uma pesquisa global do LinkedIn, 25% das mulheres negras afirmaram terem sido reprovadas em entrevistas de emprego por causa do cabelo.
Provavelmente essa não é a primeira vez que você se depara com essas duas palavras juntas: cabelo ruim. Preconceito associado com falta de informação… por que tanta gente ainda usa esse termo para se referenciar ao cabelo crespo de pessoas negras?
A questão é um pouco mais complexa do que parece. Vivemos em um país racista, em que milhares de mulheres se submetem a procedimentos nos fios para se sentirem enquadradas na sociedade e fugir de possíveis preconceitos.
Se esse cenário ainda não mudou, ele precisa mudar já, pois um fato é: não existe cabelo ruim. A Historiadora e Doutoranda de História Social da África pela Universidade Estadual de Campinas, Dandara Matos nos ajuda a entender melhor esse cenário e também compartilha um relato pessoal sobre a sua relação com seu cabelo.
Cabelo ruim: de onde veio esse termo racista?
Dandara contextualiza que não há um marco histórico de surgimento do termo, mas que ele está ligado ao período de escravidão que, no Brasil, sobreviveu por quase 400 anos.
O termo é uma forma racista de descrever que um cabelo presta, e nesse caso esse cabelo segue um padrão europeu, enquanto os cabelos de origens africanas são inferiores.
Essa distinção do que é bom ou ruim em uma dicotomia entre o branco e negro ganha muita força no Brasil no século XIX, com o racismo científico e abolição da escravatura.
As relações raciais atingiam aqui outro patamar, era preciso demarcar mais ainda que a raça negra era inferior, dando intensidade ao racismo, criando termos pejorativos, difundido a ideia de selvageria e incapacidade de sermos civilizados, jogando boa parte dos ex-escravizados para a margem da sociedade, negando educação, saúde, segurança, emprego.
E com o cabelo e outros pontos da estética de pessoas negras, a situação não seria diferente. Foi criado um padrão de beleza europeu alimentado por toda a sociedade, deixando escrachado os padrões europeus como os positivos e padrões africanos como negativos.
Nessa história, ruim é o racismo e o preconceito
Precisamos combinar que, durante muito tempo da história o cabelo crespo foi ignorado com relação a como cuidar corretamente, os melhores tipos de produtos para serem usados e, no geral, a falta de olhar para essa curvatura de fio.

Depois de tantos anos e, em um país em que 54% da população se declara negra (de acordo com o IBGE), finalmente chegamos a um patamar em que não falta informação de qualidade para acabar com preconceitos e dar poder aos cabelos crespos.
Não é à toa o grande sucesso que foi — e ainda é — a transição capilar na internet: mulheres com cabelos crespos descobrindo o potencial dos seus fios naturais, sendo exemplos para outras gerações de crespas.
E isso não é um discurso em vão: a ONU fez um levantamento e percebeu que, apenas em 2017, as buscas por cabelos crespos aumentaram consideravelmente no Google Brasil, cerca de 300% a mais do que cabelos lisos, principalmente por conta da força de influenciadoras e das redes sociais dando visibilidade para o assunto.
Esse deveria ser o normal, né? Visto que temos uma porcentagem significativa da nossa população com cabelos naturalmente crespos ou cacheados.
Já são 135 anos da abolição, mas ainda precisamos falar (gritar), que somos belos, inteligentes, que temos uma potência para o desenvolvimento. Ainda precisamos dizer que não somos bandidos, que não queremos morrer todos os dias, que temos direitos. Veja só, uma sociedade que ainda nos obriga a falar o óbvio, você acha mesmo que está pronta para se despir dos seus termos racistas? Quanto mais avanços, o racismo brasileiro se reinventa. Hoje as industrias capilares nos enxergam, mas tivemos que gritar muito que éramos consumidores e que gostaríamos de cuidar dos nossos cabelos como eles são.
Dandara Matos, Historiadora e Doutoranda de História Social da África pela Universidade Estadual de Campinas
São anos e anos em uma cultura de padronização dos fios, em que o cabelo perfeitamente liso, alinhado e sem frizz sucederam a normalização de termos como esse. Para mulheres negras, estamos falando de uma associação direta entre o cabelo crespo com um cabelo mal-cuidado.
As buscas no Google pelo termo ‘cabelo ruim’ ainda são altas, e geralmente acompanhadas com frases do tipo ‘como cuidar’, ‘como acabar’, ‘o que fazer’… nos mostrando que muitas mulheres negras ainda aceitam o termo para se referir aos seus cabelos.
O que queremos dizer com isso? Definitivamente, que já está na hora de se desprender de padrões societários e não se intimidar com o racismo, pois estamos falando de um crime.
Mulheres pretas e a sua relação com o cabelo
A historiada Dandara Matos compartilha um relato pessoal da relação com o seu cabelo ao longo de sua vida:
“Eu sou Dandara Matos, tenho 33 anos, sou uma mulher preta, baiana de Salvador. Sou formada em História pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, mestre em Estudos Africanos pelo Instituto Universitário de Lisboa – ISCTE IUL e doutoranda em História Social da África pela Universidade Estadual de Campinas.
Sou militante das causas negras e afrodescendente e não faço isso porque é “moda”, mas sim pelo fato que o racismo brasileiro não deixa minha pele descansar.
O tema sobre cabelo é muito caro para mim, por muito tempo, mesmo tendo muito orgulho de ser negra, eu nunca consegui amar meu cabelo e isso se dava por causa do racismo sofrido durante boa parte da minha vida.
Até 2014, com 24 anos, eu alisava o cabelo, vez ou outra trançava, e isso era o máximo que conseguia chegar das minhas raízes. Até que decidi fazer a transição capilar.
Nesse processo foi muito importante o apoio de todos os familiares e amigos, mas foi fundamental a troca com os grupos do Facebook sobre a temática, foi importante entender que não estava só no processo.
Para esse momento da minha relação com o cabelo e para entender esse processo, super indico o trabalho da historiadora Denise Bispo dos Santos, ‘Para além dos fios: cabelo crespo e identidade negra feminina na contemporaneidade’, é bem esclarecedor sobre a temática e tem o depoimento de várias mulheres pretas e suas relações com o cabelo, falei um pouco sobre isso também neste trabalho.

Hoje sou uma mulher preta que ama seu cabelo, suas texturas, que compreende o que é viver com ele. Tenho muito orgulho de tudo isso, de quem eu sou e de quem meu cabelo me tornou.”
Não existe cabelo ruim
Felizmente, o trabalho de mulheres pretas na história e na mídia vem abrindo muitos caminhos e conversas sobre o tema, trazendo informação de qualidade, cada vez mais profissionais especializados em cabelos crespos e pessoas engajadas em reafirmar a importância da liberdade de escolha e confiança em seus cabelos.
Segundo Dandara, a única forma de mudar esse cenário é com a educação, atrelada também a reparação e dívida histórica que o Brasil tem com a população negra.
Em suma, é preciso que os brancos entendam que o racismo é problema para ser resolvido por eles, foram eles que criaram e são eles que precisam combater. Isso não é um problema dos negros e temos outras coisas para nos preocupar, do que só combater o racismo. Precisamos correr atrás e batalhar para reparar os vários anos de descaso e violência contra nosso povo. Então cabe ao branco se educar e destruir aquilo que ele mesmo criou. Já passou da hora de saberem limparem suas sujeiras.
Indicações do time TPC
E para dar toda a visibilidade que os cabelos crespos merecem, selecionamos o nosso TOP 5 das melhores matérias de cuidados para cabelo crespo, para que todo mundo tenha a oportunidade de saber mais sobre essa curvatura tão maravilhosa e cheia de possibilidades:
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E é claro, também não poderia faltar alguns produtinhos para cuidar dos fios. Não deixe de conhecer o Shampoo, Condicionador e Creme de Pentear Dove Texturas Reais Cabelos Crespos.
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